Convivendo há mais de um ano com a Covid-19, ainda tateamos no escuro sobre muitas questões que envolvem o vírus. Ainda assim, graças ao trabalho incansável de estudiosos em todo o mundo, importantes passos foram dados, como na produção de vacinas, principal estratégia de enfretamento à doença.
Dentre outros aspectos que vêm sendo pesquisados, estão as sequelas deixadas pelo novo coronavírus. “A Covid-19 é uma patologia que vai além do processo infeccioso viral e induz a inflamação dos vasos, favorecendo um ambiente de coagulação vascular disseminada que afeta diversos órgãos e sistemas”, explica o professor, pesquisador e farmacêutico Wagner Soares. Vice-coordenador do Laboratório de Bioinformática e Química Computacional da Uesb, o professor integra uma pesquisa sobre os efeitos da Covid-19, a curto prazo (post-covid-19) e a longo prazo (long-term).
“Desde o início da pandemia, quando começamos a trabalhar na linha de virologia e de busca de novos antivirais, percebemos que os pacientes com Covid-19 apresentavam sinais e sintomas após a cura, e muitos desses efeitos se mantinham após alguns meses”, conta o professor. A pesquisa identificou efeitos nos sistemas imune, hematológico, pulmonar, cardíaco, gastrointestinal, hepático, renal, dermatológico, musculoesquelético, neurológico, além do tecido adiposo e, até mesmo, na saúde mental dos pacientes.
O que causa sequelas? – Com o objetivo de entender os mecanismos fisiopatológicos e moleculares da Covid-19, o estudo chegou às causas das complicações que permanecem após o fim da infecção pelo novo coronavírus. Além do dano causado, diretamente, pelo vírus e da desregulação de vias metabólicas, a pesquisa apresenta a “tempestade de citocinas”.
“A resposta de produção de citocinas envolve um mecanismo de defesa natural do organismo”, descreve o professor, que ainda complementa: “quando se fala em ‘tempestade de citocinas’, temos um efeito exacerbado da produção dessas substâncias químicas endógenas, que são responsáveis em ativar diversos sistemas fisiológicos e rotas bioquímicas”. Ou seja, essa produção em grande escala, chamada de “tempestade de citocinas” pelos pesquisadores, pode, então, levar consequências danosas aos tecidos do corpo humano.
Quem pode ter sequelas? – Entre os desafios da Covid-19 para a ciência, está o de ser uma doença estudada em tempo real. Isso quer dizer que muitos aspectos ainda são desconhecidos. “O que sabemos, até o momento, é que pode existir uma variabilidade da resposta imune de indivíduo para indivíduo, e que a presença de comorbidades pode intensificar a resposta inflamatória provocada pela ‘tempestade de citocinas’”, relata Soares.
Segundo o pesquisador, a hipótese levantada em seu último artigo publicado é a do chamado “fenótipo pro-coagulante”: fator genético que existe em algumas pessoas e que leva ao desenvolvimento de uma resposta mais intensa. “Contudo, precisamos cruzar informações sobre esses dados genéticos, de biomarcadores inflamatórios, e analisar os perfis de cada grupo de indivíduos, desde os que apresentaram Covid-19 leve àqueles que desenvolveram Covid-19 grave e sobreviveram”, fundamenta o professor.
É nesse sentido que o estudo continua. “As perspectivas futuras envolvem o estudo do padrão genético de expressão dos indivíduos e de proteínas, que são produzidas durante o processo de inflamação, para entender quais são mais importantes no processo de sinalização molecular”, aponta. “Seguimos estudando a fisiopatologia e mecanismos moleculares, pois percebemos em conversas com pesquisadores parceiros nacionais e internacionais, que novos eventos patológicos agressivos têm aparecido em outras faixas etárias, e ainda não são totalmente descritos”, finaliza o pesquisador.
Laboratório de Bioinformática e Química Computacional da Uesb – Desde março de 2020, o Laboratório, localizado no campus de Jequié, vem desenvolvendo pesquisas e publicações de artigos voltados para a Covid-19. Dentre eles, estão estudos relacionados com a busca de novas terapias e compostos inibidores em produtos naturais, proposição de drogas para uso na prevenção da doença, marcadores de lesão cardíaca em pacientes com Covid-19 grave, e esse mais recente sobre os efeitos a curto e longo prazo, conduzido pelo professor Bruno Silva Andrade, coordenador do Laboratório, em parceria com outros pesquisadores.